Articulação Nacional de Marchas da Maconha

A Marcha da Maconha esta cada vez mais articulada nacionalmente. Conheça a Carta de Princípios da Articulação Nacional de Marchas da Maconha e participe da Marcha da Maconha em sua cidade.

CARTA DE PRINCÍPIOS

A Marcha da Maconha é um conceito de manifestação que é replicado em diversas cidades do Brasil e do mundo. As Marchas da Maconha são, portanto, manifestações políticas pela mudança da lei de drogas, eventos múltiplos e diversos, congregando-se como um movimento social que se organiza de forma descentralizada nos territórios, que se organizam de forma descentralizada nos territórios, em organizações locais autônomas. Não existe uma “Marcha da Maconha do Brasil”, ou uma “Marcha da Maconha Nacional”, somos muitas marchas, muitos sotaques, muitas cores, uma diversidade de iniciativas locais, autônomas, que não necessariamente participam ou se fazem presentes nessa articulação. A articulação não pretende falar pelo movimento social e todas as cidades que realizam Marchas da Maconha no Brasil. As organizações de Marchas da Maconha locais ou os coletivos antiproibicionistas que organizam Marchas da Maconha locais e participam da Articulação somos apenas esses que assinamos abaixo e endossamos esta carta de princípios. Não temos representantes, líderes, coordenadores, caciques, presidentes, não somos um “comitê central”.

1 – Antiproibicionismo e nossas perspectivas da Guerra às Drogas.

Nossos princípios são a autonomia, o consenso, a horizontalidade, a participação, a transversalidade e o antiproibicionismo. Por autonomia entendemos a capacidade e o direito de cada organização e coletivo local acerca de sua autodeterminação e soberania em suas decisões e relações internas. Também nesse princípio se encontra a autonomia da própria articulação em relação a outras organizações com as quais pode trabalhar para fins comuns, como partidos e movimentos sociais. Ainda em relação à autonomia, as
proposições da articulação são consultivas e não vinculantes, respeitando portanto a posição de cada Marcha e de cada coletivo em sua localidade. Pode haver uma posição majoritária ou mesmo hegemônica, mas isso não implica que as Marchas articuladas devem adotar essa posição. As únicas decisões vinculantes são acerca da própria Articulação em seus espaços soberanos, mas jamais desta para alguma Marcha ou coletivo em específico.
O consenso, enquanto método de tomada de decisão política, também faz parte dos princípios, articulando-se com a autonomia. Isso porque a busca por decisões consensuais evita distorções causadas por simples votação e contagem a partir de maiorias consolidadas. Nessa metodologia (que será detalhada no ponto 3) são favorecidos os argumentos e sua apresentação ao coletivo ao invés das
correlações de força anteriores ao debate.
Nesse sentido, a horizontalidade também se faz um princípio fundamental. Todos devem ter igual acesso às instâncias decisórias e o direito de expor suas ideias. Refutamos veteranices, carteiradas, personalismos e critérios enviesados, como fama e seguidores nas redes sociais são contrários a esse princípio e devem
ser, portanto, evitados e desestimulados durante o convívio e na tomada de decisões.
A participação na construção da Articulação, por outro lado, é um princípio relevante: para evitar a formação de lideranças alheias às práticas coletivas e uma separação rígida entre executores e planejadores, é preciso que todos os interessados em maior ou menor grau participem. Dessa forma, esse critério é reconhecido como justo, todas as opiniões devem ser ouvidas, mas as decisões e impasses devem ser tomadas por aqueles que participam, sendo as assembleias como as reuniões ordinárias e o encontro anual as instâncias soberanas dessa Articulação.
A transversalidade também se faz um princípio fundamental. A pauta antiproibicionista não pode prescindir de apoiar as lutas antirracista, antimanicomial, feminista, LGBTQIAPNB+, as lutas da classe trabalhadora, dos povos originários, anticapitalista, sócioambiental, pelo desencarceramento e pelo fim da violência na sociedade atual.
Por fim, mas não menos importante, por antiproibicionismo entendemos a luta contra o atual sistema de proibição de plantas e substâncias sob a alcunha de drogas, em seus aspectos patriarcal, classista, racista e autoritário. O antiproibicionismo que defendemos só faz sentido nesses termos. É preciso falar de
classe para firmar a denúncia que a proibição é um instrumento do capital para manter oprimidos os territórios dos trabalhadores enquanto gera lucros bilionários para a indústria de armas e para os bancos, o que se mostra evidente quando a ação do aparato jurídico e policial na repressão age de forma desigual e pune com maior violência a classe trabalhadora do que os privilegiados pelo capitalismo. Além
disso, também é preciso pautar a desigualdade racial, existente devido aos perversos mecanismos coloniais, entre os quais a violência da proibição é um dos principais e contra os quais nos colocamos. Aliada a desigualdade social, junto ao racismo presente na sociedade brasileira, o proibicionismo blinda as relações patriarcais de opressão de homens contra mulheres se apresentando como um dos principais mecanismos de controle violento contra as mulheres vulnerabilizadas, evidenciada com a escalada de encarceramento desse público após 2006. A proibição contra a qual lutamos também deve ser denunciada em seu aspecto autoritário: os marcos do direito e da dignidade humana são constantemente
violados sob o pretexto de combater plantas e substâncias, sendo na prática, um pretexto sem respaldo jurídico para a morte de inocentes.
A luta antiproibicionista deve passar por esses eixos para que tenha efetividade na transformação social: há quem defenda a legalização de apenas alguma planta ou substância, ou quem procure uma solução através do mercado capitalista para problemas pontuais causados pelos efeitos da proibição, mas essa
postura consideramos insuficiente. Para superar as injustiças atuais é preciso atacar a raiz do problema: a proibição como um fenômeno social a ser superado em sua totalidade.

Objetivos:

Geral:
Promover e fortalecer a construção de Marchas da Maconha e eventos antiproibicionistas de caráter político, lúdico, científico e terapêutico no território nacional (e em articulação com movimentos estrangeiros dentro da pauta).

Específicos:
Organizar e fortalecer Marchas da Maconha e demais movimentos e manifestações antiproibicionistas. Provocar o debate acerca das consequências do proibicionismo na esfera pública e na política nacional.
Reunir e organizar coletivos para articulação das lutas dentro das nossas pautas.
Organizar e fortalecer coletivos e organizações de caráter antiproibicionista no território nacional.
Fortalecer a democracia e o campo democrático nas disputas políticas no Brasil.
Exercer pressão política nas instituições para a alteração do quadro legal que consideramos problemático.
Fortalecer a comunidade científica, sobretudo aquela que trabalha diretamente com o tema.
Promover o diálogo e articulação com as associações de cultivo e de diversas naturezas.
Buscar a superação do atual marco produtivo com vistas à sustentabilidade e interação entre os elos da cadeia produtiva, para superação do capitalismo global.

2 – Outros compromissos

Acreditamos que a luta antiproibicionista envolve outros compromissos, além do enfrentamento à denominada “guerra às drogas”. Não é coerente afirmar-se contra uma opressão e ignorar as demais e os estigmas relacionados a grupos vulnerabilizados.
A sociedade na qual vivemos é marcada, há séculos, por desigualdades que se intensificaram e hoje no Brasil menos de 5% da população detém mais de 50% da riqueza. E se alguma ilusão em relação às possibilidades de “justiça social” no capitalismo ainda restava, as brutais desigualdades na distribuição e acesso à saúde, tais como as vacinas durante a pandemia de COVID-19 em escala planetária, mais uma vez às pulverizaram.
Por isso, afirmamos entre nossos princípios a luta anticapitalista, não somente em aspectos das políticas de drogas, e igualmente contra o racismo, intolerância religiosa, sobretudo contra opressões, violências e desigualdades sociais aos povos originários, comunidades quilombolas, povos ciganos, povos ribeirinhos, a juventude negra periférica, ao povo negro favelado, as pessoas egressas do sistema prisional, a psicofobia e a manicomização, o capacitismo, a sorofobia, a aporofobia, o ageísmo, a xenofobia.
Será no cotidiano de nossas ações que trabalharemos para superar a dominação de corpos, frutos do patriarcado, do machismo estrutural, do sexismo e de outras opressões, violências e estigmas à comunidade LGBTQIAPNB+, inclusive entre nós, militantes antiproibicionistas, para evitar reprodução de práticas discriminatórias e intolerantes.

3 – Como nos organizamos?

Nos organizamos respeitando as autonomias dos coletivos que integram a Articulação. Nos enxergamos como espaço de contato entre coletivos organizadores das Marchas da Maconha e outras organizações, reunidos com o fim de amplificar nossas atuações, sejam elas localizadas (marchas, lives ou eventos específicos), sejam elas de alcance nacional (Dia da Maconha Medicinal, Descriminaliza STF,
etc).
Ao longo dos dois anos de atuação da ANMM constituímos acúmulos e acordos sobre práticas de organização, os quais descrevemos a seguir:

1 – Decisões substantivas são tomadas em reunião, e não em ambientes não-presenciais (grupos de whatsapp, lista de e-mail, fóruns na internet, etc).

1.1 – As reuniões têm autonomia para delegar, pontualmente, as decisões para outras instâncias, tais como Grupos de Trabalho, grupos de chat, comissões ad hoc, etc.

1.2 – A mesa constituída para uma reunião e a comissão de mediação dos chats (Admins) são os moderadores de tais espaços e cabe a todos respeitar a legitimidade de suas intervenções.

1.3 – Não se deve tomar a palavra à força, nem fazer justiça com as próprias mãos.
Queixas e recursos devem ser encaminhados de forma clara e amigável e em seguida deve-se aguardar pela deliberação da moderadora constituída.

1.4 – Cabe a mesa moderadora garantir a realização da reunião, cumprindo a função de mediação, observando a pauta e convencionando coletivamente desde o princípio a duração estipulada para os pontos de discussão. A função de mediação deve garantir o andamento da reunião dando a palavra a uma pessoa de cada vez e não permitindo que haja interrupções nem que o tempo de fala seja extrapolado. Uma pessoa deve ser apontada como relator e se responsabilizar pelo registro das
propostas de encaminhamento e moções feitas pela plenária para a moderação, assim como as deliberações referentes às propostas de encaminhamento e moções de ordem.

2 – Nossas decisões, como reflexo do caráter da ANMM, não são vinculantes (de cumprimento obrigatório), mas consultivas (recomendações), em respeito à autonomia dos coletivos.

3 – Nos orientamos pelos consensos. Isto implica em três possibilidades de deliberação:

A – Acordo coletivo, no qual todos os participantes estão em sintonia com a decisão;

B – Acordo consentido, no qual uma ou mais partes não concordam, a priori, com um encaminhamento, mas, em prol do avanço das atividades e/ou debates, admitem uma decisão majoritária;

C – Obstrução
, na qual uma (ou mais) das partes entende que uma determinada divergência ou um desacordo impossibilita o prosseguimento das atividades e/ou debates, sendo necessária, portanto, uma discussão mais aprofundada e pormenorizada, em nova data, com vistas a atingir o consenso (itens A e B);

4 – Temos a paz entre nós como princípio fundamental para a atuação conjunta.
Este preceito visa garantir o direito à diversidade entre nós, para sustentar/salvaguardar as bem vindas discordâncias políticas apresentadas de boa fé. Prezamos, portanto, por um Acordo de Convivência democrático e protetor da 1 ampla extensão de opiniões que compõem a ANMM. Entendemos que uma
estrutura de organização é necessária para garantir a horizontalidade e evitar formação de posturas tirânicas (decisões unilaterais sem consultas ao coletivo ou constituição de poder informal).

5 – Para fins de organização, dispomos das seguintes estruturas, por ordem de prioridade/preponderância:

A – Encontro Nacional da Articulação;
B – Reuniões Ordinárias (por ora, aos domingos de noite);
C – Reuniões Extraordinárias;
D – Grupos de Trabalho;
E – Comissões Ad Hoc;

5.1 – Grupos de Chat (WhatsApp, Telegram, etc) servem como espaço de comunicação e divulgação e, eventualmente, para decisões práticas como definir datas para reuniões, quando delegado por uma instância superior, ou referendar assinatura em manifestos e documentos que necessitem urgência, sempre que o conteúdo em questão esteja de acordo com a carta de princípios e não haja
obstrução de ninguém.

6 – Os Grupos de Trabalho (GTs) são estruturas da ANMM voltadas para a operacionalização de tarefas determinadas em instâncias superiores. Dispõem de autonomia prática e devem reportar seus acúmulos à coletividade durante as reuniões Ordinárias, Extraordinárias e/ou ao Encontro Nacional.

6.1 – Os GTs devem apresentar seus acúmulos ou suas dificuldades, inclusive para conseguir ajuda, quando necessário, às reuniões ordinárias ou aos demais GTs.

6.2 – Os GTs a que não se tenha delegado autonomia decisória, apenas executiva, levam informações e acúmulos para a instância decisória previamente acordada (como as reuniões).

7 – Recorremos ao GT de Harmonia para:

1 – Garantia de espaços seguros, livres de violências e de opressão, abertos à diversidade democrática.

1 Documento a ser elaborado posteriormente e referendado por uma instância superior da ANMM.

  • Acordo de convivência (É responsabilidade do GT formular/aperfeiçoar propostas e submetê-las ao plenário das reuniões ordinárias).
  • Moderação dos chats (O GT deve propor método e apontar responsáveis [ADMINS com mandato] e zelar pela circulação da tarefa).

requisito/ pré condição para a intervenção:

  • Deve ocorrer agressão direta ou indireta entre membros ou violação dos acordos de convivência.

2 – Mediação de conflitos entre membros (Cabe ao GT propor método e apontar comissão [AD HOC]).

requisito/ pré condição para a intervenção:

  • As partes envolvidas no conflito precisam concordar com uma composição consensual.

3 – Tratamento a questões de conduta ética na militância (é dever do GT propor método e apontar comissão [AD HOC]).

requisito/ pré condição para a intervenção:

  • O conflito deve envolver infrações ao acordo de convivência, aos valores ou princípios de toda a coletividade.

Articulação Nacional de Marchas da Maconha, 17 de Julho de 2022.

Fonte: Foto de capa do https://mundoeducacao.uol.com.br/drogas/maconha.htm

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