Homenagem Lida na Missa de 70 anos de Casamento da Vó Josa com o Vô Valdemar.

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n Bodas de Vinho, Valdemar e Josina.

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nUma coisa é como anhistória foi ou é, a outra é como cada um de nós a percebe. Aqui estamosnfalando de uma longa história de 96 anos como filho, homem, pai, avô e bisavô;nde uma longa história de 86 anos (quase 87) como filha, mulher, mãe, avó enbisavó; de uma longa história de 70 anos de casamento. Não é todo dia que umncasal completa bodas de vinho.

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nNessa histórianposso falar como neto, como homem, como ser político, como amor. Não posso serncerteiro, mas posso falar como vi, ou imagino ter visto, e como ouvi, ounimagino ter escutado.

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nLevando em conta anancestralidade, os quase 10 anos a mais de vida, vou começar em 17 de fevereironde 1922, quando nascia Valdemar Holanda Freitas, que como disse para uma densuas filhas, a vida o desviou de ser um Camões. Pois ele nascia em meio ansemana de arte moderna, momento de ruptura e reconstrução da cultura do nossonpovo, do nosso tão diverso Brasil. Nasceu em meio as apresentações denVilla-Lobos e casou no mesmo ano que o maestro casou pela segunda vez, em 1948.nUm homem que vejo como do campo, trabalhador rural, que gosta da vida, viola,naboio e repente.

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nEm 05 de novembronde 1931, no dia nacional da língua portuguesa, nascia Josina Moraes Freitas,nque por ironia do destino, desafiando os preconceitos da época, mostrou quenaprender a ler e escrever também era para mulher, mesmo que com uma vareta nanareia, no pó, de onde viemos e para onde vamos, segundo outros versículos denuma das leituras feitas hoje. Conheci um pouco mais de vó Josa vendo com ela onanime “Vida Maria”, que conta a história de muitas Marias do nosso sertão, donnosso semiárido, sendo nossa vó uma dessas guerreiras. Uma mulher que vejo comonda cidade, trabalhadora da casa e empreendedora, uma artesã que gosta da vida,nda arte e da piada.

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nCasaram nonreligioso no Dia de Todos os Santos e no civil em uma Quarta-feira de Cinzas. Onque isso significa? Para alguns, nada; mas eu li como uma vida de resistência,nreflexão e ressignificação daquele 01 de novembro de 1948, até os dias de hoje.

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nUma pausa parandizer que lembro de muitas piadas e cantorias na calçada. Da época que aindanexistiam veados em nossa caatinga. Perdi as contas de quantos “dezintrosenmenino” ouvimos quando estávamos amontoados no meio da casa. Esses dias, cadanum e cada uma já lembrou e ainda vai lembrar e refletir muito sobre nossanhistória.

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n15 filhos e filhas,na jovem a mais tempo nascida em 1949 e os jovens a menos tempo em 1969. Depois,nsegundo o último censo do IBGE, 27 netos e netas e 17 bisnetos e bisnetas,nsendo a primeira nascida no mesmo 05 de novembro que a vó Josa, segunda-feiranainda temos festa, de 87 anos da vó e 17 anos da Luar.

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nVoltando… Anpartilha enchia a casa naquele 01 de novembro. Dali em diante, trabalhoncoletivo, nem de um, nem da outra, trabalho do casal, nenhum menos ou maisnimportante que o outro, construção coletiva, pesos diferentes, pesos divididos,nmas pesos que recaiam primeiro sobre dois, depois sobre outros que chegavam ensentiam o peso dessa caminhada coletiva.

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nSejam 96 ou 86nanos, ou mesmo 70 anos conjuntos, viveram e viram o que muitos de nós, emnespecial os mais novos, dentre os quais estou incluso, já que estamos falandonde 5 décadas a menos que o vô, conhecemos apenas em livros, blogs, card de zap,nou de ouvir falar.

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nEm termos densociedade viram a fome de muitos. O trabalho infantil em sua face mais dura. Annaturalização de uma pisa como formação. A ditadura que protegia coronéis encomerciantes que vendiam nossa merenda escolar. As maiores secas da história,nem tempo e impacto social. Mortes por doenças, hoje, as mais ridículas.nAnalfabetismo aos montes, escolas poucas e para poucos. Frentes de trabalho semnequipamentos de segurança ou direitos trabalhistas. Viram a naturalização danviolência contra a mulher, os negros e os LGBT´s.

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nViram direitosnsurgirem, entre eles a aposentadoria rural e por idade, que hoje ambos recebem.nO surgimento de órgão de controle que antes eram inimagináveis na ditadura. Osnantigos coronéis sumindo e a política se transformando. Viram escolas abertasnpara todos e todas, não estou aqui falando de qualidade, mas de pessoas sabendonler, fazer conta e escrever, uma libertação que muitos não tiveram no passado enalguns não possuem no hoje. Viram a negritude ocupar espaço institucional enentre os nossos. A diversidade sair do armário, ser mais protegida e surgirnentre os nossos. Viram a poliomielite, que alcançou nossa família, chegar anzero. Os hospitais públicos serem abertos aos montes e salvando alguns de nós.nGrandes açudes serem construídos. Pessoas que não mais se submeteram a diáriasnque sequer pagavam a alimentação diária de suas famílias.

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nQuandonvamos ficando mais velhos, as lembranças vão ficando mais nítidas ou a históriannos é contada de forma mais objetiva. Nada disso que resgato é distante dennossas famílias. Entre filhos, netos e bisnetos, somos mais de 50. Minha filhanjá levou alguns bons carões, mas nunca dei um tapa, ajuda em casa, cursa o 2ºnano, faz inglês há alguns anos, respeita os mais velhos, sabe que a vida e oncuidado das pessoas é para além da nossa família, é para toda sociedade. A pisane a formação que levou o vô e vó, não é igual a que levou os filhos maisnvelhos, nem aos filhos mais novos, nem é igual a formação dos netos, netas,nbisnetos e bisnetas. A estrutura social se transforma, se complexifica, nossos avósnsão parte da história, se transformaram com ela.

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nO Deus que conhecincom meus avós é para além de um indivíduo, para além de uma única família, énpara o desconhecido que almoçava em nossa mesa, a conta na caderneta que sabiamnque jamais seria paga, o aluguel atrasado sem tensionar o despejo, a terrandoada com vista privilegiada para Mombaça.

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nUma história denacolhida, de filhos que vão e voltam, que ajudam e são ajudados, que sendistanciam e se chegam, que erram e compreendem os erros de seu pai e sua mãe.nUma história de acolhida das primeiras tatuagens até as primeirasnhomoafetividades. Uma história onde a mãe de minha filha foi e é tão bemnacolhida, como é minha atual esposa, com quem espero completar nossas bodas denvinho.

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nAqui, ninguémnconhece todas as histórias, nem todas as boas, nem todas as más histórias. Hánalguns anos comecei a fazer muitas perguntas, derramei muitas lágrimas e deinmuitos sorrisos. Muitas histórias não saberei, são únicas, de cada um de vocês;noutras quem sabe eu conte no futuro; quem sabe vocês nos conte no futuro;noutras eu não contarei, são segredos que ouvi e só conto com permissão; todos entodas aqui temos nossos segredos.

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nQue arrodeio duro enchato em dia de festa, alguns devem pensar agora; mas quem assim pensa, deve tánremoendo sua lembrança, doido para que ela volte para o arquivo, para quem tándo lado não abra sua boca, ou para quem tá do lado conte sua história. Mas digontudo isso com amor, foi o que aprendi com meus avós, com minha mãe, com meusntios e tias, com meus primos e primas, com minha esposa, com minha filha entodos e todas que hoje estão em nossa família.

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nAfinal de contas,ncomo em outra leitura: “sobre tudo, amai-vos uns aos outros” e acrescento,nperdoai quando preciso, mas também quando possível, pois perdão não é faz denconta, assim como o amor não é da boca para fora. Perdoar e amar é um exercícioncotidiano.

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nAmo minha vó Josa,namo meu vó Valdemar, os amo com os erros e os acertos de uma longa história; osnamo compreendendo os diferentes momentos históricos que viveram; os amo e amoncada um e cada uma de vocês como vocês são, o que não significa seguirmos emnnossos erros, mas buscar a capacidade de ressignificação que a história dennossos avós permite.

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nAmemos enrespeitemos uns aos outros, umas as outras, uns as outras, como eles e elasnsão, não como queremos que sejam. Que a evolução prevaleça e o que foi ruim nãonvolte, nem entre nós, nem entre os outros.

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nVó, te amamos, Vô,nte amamos. Feliz bodas de vinho!!!!!

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nMombaça-CE, 01 dennovembro de 2018.

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nTárcio HolandanTeixeira

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nNeto, Filho, Sobrinho,nIrmão, Primo, Pai, Marido.

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nCidadão verde,namarelo e vermelho pau Brasil.

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