Cada um é seu Próprio Baú!

Há muitos anos eu queria um baú! Essa vontade teve início quando comecei a ler algumas coisas sobre Raul Seixas, a quem fui apresentado oficialmente pelo amigo Albérico em 1994, quase ao mesmo tempo em que eu conhecia minha primeira namorada, “ela era de leão e eu tinha 16”, tipo Eduardo e Mônica mesmo.
n
Mas voltemos ao baú e pulemos alguns anos, vamos para 2006, ano do meu 2º casamento. Neste ano, quando mudamos para nossa casa – ou da caixa até 2036, ainda não havíamos sequer terminado de levar todos os móveis, quando o porteiro chamou e disse: “deixaram esse baú para você”. Exatamente assim, no singular, meu, não do casal.
n
Faremos, tanto eu e Áurea como eu e meu baú, 5 anos juntos. Já pensei muito, e confesso que ainda penso, de onde teria vindo esse baú, quem poderia ter deixado esse presente. Jamais consegui imaginar ser uma mera coincidência!
n
Apesar de apenas 5 anos juntos, ele aparenta ser de 1977, ano do “dia em que a terra parou” (Raul) e o mesmo em que eu nasci, lá no sertão do Ceará. Hoje não consigo contar quantas pessoas, histórias, entidades ou objetos estão no baú. Olhe que não estou incluindo as tantas histórias anteriores ao nosso encontro. É gratificante, mas também dolorido, abrir e revirar meu baú.
n
Vejo muitos carnavais, algumas paixões e poucos amores. Vejo entidades estudantis, sindicais, anos de estudo e algumas aprovações. Vejo anos pertinho, vivendo o cotidiano da minha Luar, os primeiros passos, as primeiras palavras, as mais diversas descobertas de outras tantas que ainda virão.
n
Porém, vejo também a dor de não mais abraçar todos os dias a minha princesa. Revirando um pouco mais vejo o pai que não tenho lembranças e pessoas que, possivelmente, um dia não lembrarão mais de mim. Amigos ali estão, juntos aos sonhos de dezenas de jovens que hoje são realizados ou abortados pela vida, ou pela morte.
n
Poesias, partidos, batizados, casamentos, até telefone sem fio – daqueles com duas latas e um fio, tudo e mais um pouco fica lá, guardadinho em meu baú. Lá eu guardo Ceará, Paraíba, Alagoas, Maranhão, Rio Grande do Sul, Bahia, Sergipe, Espírito Santo, São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco e até um pedacinho da Europa, enviado por Dany, e do Chile, enviado por Dina.
n
Esses dias visitei meu baú, vasculhei com cuidado em busca do presente. Lá estava o presente, cá está o presente! O passado presente na minha frente, segurando meu pescoço com as duas mãos e dizendo: o futuro é pra lá!
n
Não seria nada sem o passado vivido! Não seria nada sem viver o presente! Não seria nada sem pensar no futuro!
n
Sei que não foi para mim, mas Marcelo Nova parece contar minha história quando canta: “Pois eu fui puxado a ferro arrancado do útero materno/ Eu apanhei pra poder chorar”. Por essas e outras, pelo desejo do presente e vontade no futuro, sigo eu e meu baú! Não somos de nenhum lugar, mas viemos para ficar!

Deixe um comentário